Restauração ecológica na prática
O décimo volume dos Cadernos do Diálogo, mais nova publicação do Diálogo Florestal, traz à luz o tema da restauração no contexto da Década das Nações Unidas para Restauração de Ecossistemas 2021–2030. A publicação “Desafios para Ganhar Escala na Restauração e o Papel da Sociedade Civil”, que analisa a importância do viés social da restauração, é considerada uma ferramenta de trabalho alinhada aos compromissos assumidos pelos Estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU), em 2019, quando do estabelecimento da Década da Restauração. De acordo com a secretária executiva do Diálogo Florestal, Fernanda Rodrigues, o objetivo com o lançamento do caderno é mobilizar esforços de cooperação e ampliar as ações para recuperar serviços ecossistêmicos nos diversos biomas do país.
Na avaliação de Regina Cavini, oficial sênior de programas e representante interina do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) no Brasil, responsável pelo prefácio da publicação, os serviços ecossistêmicos são aliados indispensáveis no alcance dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e das 169 metas da Agenda 2030, a qual estabelece um plano de ação para erradicar a pobreza e promover vida digna para todos e todas dentro dos limites de resiliência do planeta. “O equilíbrio ecológico do planeta é condição necessária para a garantia dos direitos humanos. Não será possível alcançar as metas climáticas do Acordo de Paris (Convenção Quadro da ONU sobre Mudança do Clima), as metas do Quadro Global para a Biodiversidade (Convenção sobre Diversidade Biológica) e as de Neutralidade de Degradação de Terras (Convenção de Combate à Desertificação) sem a conservação, o manejo e a restauração dos ecossistemas naturais, urbanos e agrícolas”, afirma.
O caderno apresenta a importância da construção de um novo pacto social para além de plantar árvores, considerando gênero, respeito à diversidade e proteção dos recursos naturais no contexto da emergência climática e das perdas de ecossistemas. Somado a isso, a necessidade de olhar para a soluções baseadas na natureza, a escuta ativa, a dignidade humana e os direitos dos povos tradicionais e indígenas.
O documento apresenta ainda a contribuição do setor privado para a construção da visão da paisagem e a capacidade brasileira de inovar em governança de conciliação de múltiplos atores e interesses. São apresentadas, por exemplo, as experiências bem-sucedidas do pioneiro Pacto Pela Restauração da Mata Atlântica, criado em 2009, passando pela Aliança Pela Restauração na Amazônia, de 2017, a iniciativa Araticum, no Cerrado, além da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura e do Diálogo Florestal.
Outro ponto de destaque é o fator econômico como um dos pilares centrais, com o alerta de que a falta de entendimento do conceito de capital natural e a não internalização dos serviços ecossistêmicos nas contas clássicas é um erro grave no fluxo de caixa de qualquer país. O estudo apresenta ações que possibilitariam atrair os aportes necessários para que a escala seja ampliada.
Casos de sucesso
A edição traz ainda projetos que mostram a viabilidade dos investimentos em restauração ecológica em diferentes biomas brasileiros. Dos 19 trabalhos inscritos na chamada pública promovida pelo Diálogo Florestal, a organização selecionou cinco vencedores para compor o documento.
Foram selecionados trabalhos inscritos nas categorias: larga escala, pequenas áreas e grandes impactos, impulsionamento da cadeia da restauração e inclusão social, e geração de trabalho e renda através da restauração (categoria com dois trabalhos vencedores).
Com diferentes práticas de inclusão, metodologias, abordagens e objetivos finalísticos, os projetos trazem a diversidade dos ecossistemas, das formas de realização, monitoramento e avaliação. O que chamou a atenção dos avaliadores foi um elemento comum: a contribuição da restauração ecológica tão necessária para a saúde plena das pessoas e do planeta. O comitê de avaliação que selecionou os vencedores foi integrado pelos professores Daniel Piotto e Ricardo Ribeiro Rodrigues, e a professora Fátima Piña-Rodrigues.
Conheça os vencedores
Para ler a íntegra dos projetos, acesse aqui.
Confira a live realizada no dia 13 de abril que marcou o lançamento oficial da publicação: YouTube do Diálogo Florestal.
Categoria: Larga Escala
Avanços na Recuperação da Caatinga
Renato Garcia Rodrigues, Fábio Socolowski e Daniela Mascia Vieira | Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (NEMA) da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)
O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (NEMA) da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), iniciou, em 2015, testes para criação de alternativas de recuperação das áreas degradadas vinculadas ao Projeto de Integração do Rio São Francisco com Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional (PISF).
Entre 2017 e 2021, com todos os sistemas funcionando, foram implementados mais de 770 hectares de reposição. Com ajustes constantes de método, foi possível sair de uma média de 130 hectares por ano para 430 hectares em quatro meses de execução na quadra chuvosa do final de 2020 e início de 2021. Tais ajustes perpassam até mesmo pela utilização de retroescavadeiras para otimizar a abertura de “covas”, o que possibilitou a implantação de até 35 núcleos por dia. Dessa forma, já foram plantadas mais de 78 mil mudas de espécies nativas da Caatinga e semeadas mais de 5 toneladas de sementes para cobertura do solo.
Categoria: Pequenas Áreas, Grandes Impactos
A Experiência do Restaura Alto Vale
Edilaine Dick | Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida – Apremavi
O Restaura Alto Vale está sendo desenvolvido em duas regiões do Estado de Santa Catarina, sendo sete municípios do Planalto Norte e 28 municípios do Alto Vale do Itajaí. Iniciado em janeiro de 2018, com término em 2022, o projeto tem como objetivo a restauração de 320 ha de APPs degradadas. Envolveu, até o momento, 700 imóveis rurais e atua diretamente com mais de 1.100 agricultores familiares envolvidos em todas as etapas do projeto, aumentando o entendimento da sua responsabilidade sobre o uso dos recursos naturais.
Categoria: Impulsionamento da Cadeia da Restauração e Inclusão Social
Sementes do Xingu: uma rede de coleta inspirada no bem-viver
Bruna Ferreira | Diretora e coordenadora da Rede de Sementes do Xingu
A experiência da Associação Rede de Sementes do Xingu (ARSX) comprova que a produção de sementes florestais para a restauração de ecossistemas degradados pode se constituir como um caminho efetivo para valorização da biodiversidade com inclusão socioeconômica.
A iniciativa se consolidou como um exemplo de negócio social de base florestal na Amazônia e no Cerrado brasileiros, com promoção de conhecimentos locais, conservação da biodiversidade, aprimoramento da qualidade de vida familiar e fortalecimento das relações de cooperação e da organização social dos grupos familiares e comunitários de coletores de sementes.
Categoria: Impulsionamento da Cadeia da Restauração e Inclusão Social
Replantando Vida: restauração florestal e humana
Alan Henrique Marques de Abreu, Elton Luis da Silva Abel e Paulo Henrique Pereira Reis | Engenheiros florestais da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro – CEDAE
Jorge Makhlouta Alonso | Engenheiro florestal da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ
Alcione Duarte Ferreira | Assessor de Programas Especiais da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro – CEDAE
O emprego da mão de obra de presidiários em atividades da cadeia produtiva da restauração florestal, com capacitação profissional e geração de renda, pode ser uma alternativa capaz de integrar a necessidade de restauração ecológica com a ressocialização de presidiários em uma relação ganha-ganha com reflexos sociais, econômicos e ambientais. Um dos poucos exemplos é o Programa Replantando Vida (PRV), conduzido pela Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE), que capacita, emprega e remunera indivíduos em cumprimento de pena para trabalharem nas atividades da cadeia produtiva da restauração ecológica, desde a coleta de sementes e produção de mudas florestais até o plantio e a manutenção de áreas de interesse hídrico.
O Programa ainda fomenta diversos projetos de restauração no Estado do Rio de Janeiro, fornecendo gratuitamente as mudas produzidas pelos presidiários nos sete viveiros florestais da Companhia.
Categoria: Geração de Trabalho e Renda através da Restauração
Gestão e Tecnologia por meio de PSA no Espírito Santo
Marcelo Meneguelli Campos | MV Gestão Integrada
Diante da enorme e crescente ação humana sobre os ecossistemas, instituições e governos se aliaram para buscar preservar e recuperar o patrimônio ambiental. Nesse contexto, o governo do Estado do Espírito Santo criou o Programa Reflorestar, que tem como finalidade promover a restauração do ciclo hidrológico por meio da conservação e recuperação da cobertura florestal, com geração de oportunidades e renda para o produtor rural, estimulando a adoção de práticas de uso sustentável dos solos.
O objetivo do presente trabalho foi desenvolver um sistema dinâmico de gestão de qualidade para atuar em todas as etapas do processo e garantir escalabilidade no número de produtores rurais em atendimento ao Programa e, consequentemente, promover a sensibilização ambiental e ampliar as áreas de intervenção das modalidades oferecidas de forma sustentável.
Autora: Juliane Ferreira