Centro de Endemismo Belém: desafios e diálogo

set 9, 2020 | Notícias

Território de maior densidade populacional também é o de maior riqueza biológica na Amazônia, gerando discussões sobre a relação da economia com a conservação e restauração florestal

O Centro de Endemismo Belém tem características próprias e desafios tão grandes quanto a sua extensão. Esse território em meio à Amazônia também é o mais ocupado e isso gera ainda mais pressão ao bioma. Levar as discussões em torno do Centro de Endemismo Belém e como o diálogo pode fazer a diferença foram assuntos abordados na Live Diálogos Florestais no mês de setembro, dentro da série que o Diálogo Florestal está realizando em seu canal do Youtube para incentivar ainda mais a interação entre empresas do setor e a sociedade civil.

O Centro de Endemismo Belém compreende uma área com 128 municípios, sendo 62 deles no Pará e 85 no Maranhão. É considerado o território mais rico de biodiversidade da Amazônia. Entretanto, também é o mais ameaçado: 70% da biodiversidade da região já foi suprimida para estruturação das cidades. “Das espécies ameaçadas da Amazônia, 42 são endêmicas desse sistema. Há apenas uma área de conservação e pequenas reservas florestais em toda a extensão”, conta a engenheira agrônoma Thiara Fernandes, do Instituto Peabiru e uma das participantes da transmissão do Diálogo Florestal. “É necessário que exista um esforço para a manutenção e preservação desse território”, salienta.

A pesquisadora Marlucia Martins, do Museu Paraense Emílio Goeldi, também foi uma das convidadas da live e destacou que, além de espécies que podem ser apenas encontradas no território, o Centro de Endemismo Belém ainda possui características ecológicas particulares. “É nesta região onde começou a ocupação humana na Amazônia e é a área mais densamente povoada da Amazônia. Ao mesmo tempo que reúne características biológicas importantes, também é fundamental no entendimento das relações humanas com a Amazônia”, sinaliza.

As pressões populacional e econômica sobre o bioma geraram uma série de problemas. Thiara Fernandes lembra que entre as principais atividades econômicas realizadas no território estão a agropecuária de baixa produtividade e a mineração.

As discussões em torno de um melhor uso do solo já vêm acontecendo e podem pautar ainda mais diálogos para o desenvolvimento sustentável do Centro de Endemismo Belém, como as discussões iniciadas pelo Diálogo Florestal em 2019. Uma relação mais harmoniosa entre o ambiente e o crescimento econômico já estão por trás de algumas iniciativas, inclusive setoriais.

Iêda Fernandes, que está à frente da Associação Brasileira de Produtores de Óleo de Palma – Abrapalma, revelou durante a live algumas das ações do segmento. A produção do óleo de palma tem uma grande relevância para a região – 85% da produção brasileira está concentrada no Pará -, e gera renda e bons resultados.

“No Estado do Pará, quase metade da população está abaixo da linha da pobreza. Ainda que possamos gerar empregos para 20 mil pessoas na nossa cadeia produtiva, impactando seus familiares e beneficiando um total de 80 mil pessoas, não dá para ignorar a realidade dos 23 municípios onde está concentrada a maior parte da produção do óleo de palma. Acreditamos que a economia solidária pode ser alternativa à exclusão social. Por isso, incentivamos arranjos socioprodutivos locais, associações e outras formas de união de pequenos agricultores, além de trabalharmos a agricultura familiar. Aqui na Amazônia, sobrevive quem se une”, frisa.

Thiara Fernandes, do Instituto Peabiru, salienta que é preciso trabalhar ainda mais com eficiência nos modelos de agricultura, alcançando não apenas melhores resultados, mas também um melhor uso do solo e de sua preservação. Além disso, pensar na relação extrativismo, relação da economia com a biodiversidade e serviços ambientais pode representar uma nova etapa para Centro de Endemismo Belém.

Restauração florestal e serviços ecossistêmicos

Por isso, a pesquisadora Marlucia Martins destaca a importância da restauração florestal no bioma, o que daria apoio e base para essas atividades. “Precisamos refletir como esse potencial imenso está sendo perdido ao mesmo passo em que está se perdendo a floresta. A cobertura florestal hoje no Centro de Endemismo Belém está reduzida a 20% da original. Uma economia amazônica pressupõe uma floresta amazônica que dá suporte a essa economia. Por exemplo: a floresta no entorno da roça garante a regeneração do espaço cultivado. Se não tenho a floresta, perco a oportunidade da recomposição, e caminho para a tendência de degradação do solo. Para pensar sobre potencialidade, precisamos pensamos em recomposição da floresta”, indica.

Thiara Fernandes concorda sobre a importância da recomposição da floresta no Centro de Endemismo Belém. “O que é importante é resgatar a regeneração desse modelo agrícola. Quando não tem sistema regenerado, não podemos fazer o sistema de corte e queima, que já foi eficiente, e hoje não é mais. E não tem os serviços ambientais da floresta. Não é possível ou muito difícil fazer agricultura na Amazônia”, complementa.

Apesar de todos os desafios e da degeneração, também existe resiliência no Centro de Endemismo Belém. Para Marlucia Martins, exemplo disso é o Mosaico Gurupi, que engloba a Reserva Biológica do Gurupi, no Maranhão, e terras indígenas no mesmo estado e também no Pará. Por lá acontecem várias iniciativas e pesquisas. O Mosaico exerce uma grande importância de integração para o desenvolvimento da região. E a população local atua no combate ao desmatamento e à ilegalidade, além da educação ambiental.

Marlucia lembra que é necessário pensar também na reintegração social, e não apenas ecológica, para que a sustentabilidade do Centro de Endemismo Belém seja alcançada. “A partir do processo destrutivo histórico, temos visto uma capacidade de resiliência. Estamos aprendido muito com o diálogo dentro do Mosaico Gurupi. Mas, se não houver uma reintegração social e cultural, dificilmente haverá a reintegração ecológica e a econômica”, pondera.

 

Saiba mais

Quer saber mais sobre esse tema? Assista à íntegra da live realizada pelo Diálogo Florestal sobre as ações que estão sendo realizadas na região do Centro de Endemismo Belém. Ouça o podcast produzido a partir desse debate no Spotify “Diálogos Florestais”.

Autora: Juliane Ferreira.